Felismar
Manoel – 1
Rosa
Maria Prista – 2
A
motricidade humana enquanto ciência do homem fundamenta diferentes
fazeres dos que assistem ao ser humano nos seus respectivos projetos
do estar-no-mundo para realizar alguma coisa. Entre esses
assistentes, muitos são terapeutas, para os quais não há como
olvidar as intercorrências do inconsciente presente no
desenvovimento dos projetos de vida de seus clientes manifestados
por meio da motricidade.
Já
bem afirmou Manuel Sérgio (1994), “ que a motricidade humana se
resolve em um projeto e movimenta-se desde a consciência de um ser
carenciado, até a função estrutural e estruturante, de quem
surprende o pormenor na estrutura, a estrutura no pormenor e o
presente de onde surge o futuro. E por ser projeto, o ser humano
prova que não é só razão, mas também imaginação, inconsciência
e pré-consciência, tudo reunido em um eu singular e unificante.”
É,
portanto, um eu singular, que nos tornou a cada um de nós, nos
especialistas que somos, realizando na motricidade o nosso projeto de
vida. É um eu singular que recorre aos nossos serviços nas
escolas, academias, consultórios, clínicas,, quadras desportivas,
ou qualquer dos espaços que oferecemos para a convivência empática,
ou vincular. Todos esses trazem em suas bagagens as memórias
filogenéticas e ontogenéticas, elaboradas em suas respectivas
histórias de vida, imbricadas com seus potenciais genéticos,
influências socioculturais e ambientais. Pois é de suas
corporeidades detentoras dessas memórias que surgem as motricidades
intencionalizadas, como projetos rumo à transcendência, para suprir
suas carências do mundo da cultura, mundo este que é por eles
construído, mas que também o influencia, o modifica, através das
próprias motricidades. Neste contexto a motricidade humana é uma
ponte entre a corporeidade do sujeito e o mundo da cultura, pois que
é por ela que ele efetivamente se mostra no mundo e na cultura,
com a sua identidade singular e é enriquecida essa identidade com
os aspectos que lhe despertar pertinências, do mundo e da cultura.
Aí o ser se faz epifania pela própria corporeidade enriquecida
enquanto subjetividade.
Manuel
Sérgio (1994), comentando Merleau Ponty, afirma que...”para ele
a lógica do ser tem muito de pré-racional, por isso que enraiza
também no inconsciente. Há tendências instintivas dentro de cada
um de nós, que entram em conflito com o ego e o superego, dada a sua
intensidade explosiva. A resistência à satisfação dos desejos
pode produzir o recalcamento e surgir então o desequilibrio da
pessoa. Por isso, Paul Chauchard afirmava que diante da pessoa que
sofre, não basta ser um técnico. É preciso descer, por assim
dizer, aos abismos do homem donde irrompem forças,à razão lógica
indisciplinadas e truculentas. A verdade, porém, é que o homem vive
e morre, sob sua ação. Talvez seja por este motivo que somos
naturalmente insatisfeitos. As nossas próprias limitações,
despojando-nos de presunçosa suficiência, levam-nos, sem desânimo
nem jaça, para além do que somos, em direção ao que está de
acordo com as nossas secretas medidas (des-medidas) interiores.”
Também
António Damásio (2000), comentando uma experiência realizada em
seu laboratório, em colaboração com Antoine Bechara e Hanna
Damásio, diz que, "talvez seja o exemplo mais decisivo do
processamento inconsciente obtido em suas pesquisas, um trabalho que
se baseia em uma tarefa que requer tomada de decisão, e revela que
várias decisões que exigem conhecimentos relevantes e lógica são
facilitados por uma influência inconsciente, que ocorre antes que o
conhecimento e a lógica desempenem seus papéis". Revela que
as emoções tem um papel importante no desencadeamento dos sinais
inconscientes.
Ainda
William D. McArdle (1992), em seu livro texto de Fisiologia do
Exercicio, discorreu sobre fatores psicológicos e neurais que
modificam a expessão da força humana em treinamento de resistência,
nos diferentes movimentos voluntários, e agora sem referir-se a
patologias, verificados em condições experimentais de laboratório,
e afirma que, foi a hipnose, considerada uma das mais "mentais"
das atividades, a que maior resultado ofereceu facilitando o
tratamento experimental.
No
livro Neurociência da Mente e do Comportamento, coordenado por
Roberto Lent, Vargas, Rodrigues e Fontana (2008), escrevendo sobre
o controle motor, afirmam que a motivação é crucial para a
formação de novos comportamentos motores, bem como, para a
manutenção dos comportamentos já estabelecidos.
Gazzaniga
e Heartherton (2005), escrevendo como a motivação ativa, dirige e
sustenta a ação, afirmam que as teorias da motivação enfatizam
que os estados motivacionais são energizantes no sentido de que
ativam ou estimulam os comportamentos: "são diretivas no
sentido de que orientam os comportamentos para satisfazer objetivos
ou necessidades especificas; ajudam as pessoas em seu
comportamento até que os objetivos sejam atingidos ou as
necessidades sejam satisfeitas"; a maioria das teorias concorda
que os motivos diferem em sua força, dependendo de fatores
intrínsecos e extrínsecos. Sem aprofundar em seus mecanismos,
pode-se afirmar que os instintos, necessidades, os impulsos e as
recompensas motivam o comportamento, e não sendo diferente com os
comportamentos motores, que compõem a motricidade humana.
Para
os autores, que militamos nossas práticas profissionais junto a
pessoas portadoras de disfunções psicomotoras, deficiências
cinéticas, distúrbios cognitivos e ou diferentes desajustamentos
familiares e ou sociais, é imperioso considerar o inconsciente, o
instintivo e pulsional a interferir nas condutas cinéticas
funcionais, quando das manifestações das motricidades dos
clientes, enquanto projetos de vida que são.
J.D.
Nasio (1999), um estudioso das obras de Freud, apresenta a dinâmica
do funcionamento psíquico do ponto de vista freudiano, semelhante a
um arco reflexo já bem conhecido dos profissionais de saúde, com
seus esquemas de quatro tempos, onde primeiro surge o movimento
contínuo da energia instintiva pulsional em direção ao prazer
absoluto; segundo , a barra do recalcamento se opõe a movimentação
da energia, impedindo a sua passagem total; terceiro, a energia
que não transpõe a barra do recalcamento e dá inicio a uma nova
excitação; quarto, a energia que transpõe a barra do
recalcamento e se exterioriza sob a forma de prazer parcial inerente
às formações do inconsciente. Estas formações podem ser atos
involuntários, manifestações neuróticas, relações afetivas
com uma pessoa, ou com coisas, consigo mesmo, transferidas para seu
analista, terapeuta, professor, treinador, ou qualquer outro
assistente.
Assim,
percebe-se, que não há como negar, ou ignorar, a presença do
inconsciente humano agindo ou interferindo nos comportamentos motores
voluntários e também nas condutas psicomotoras, sempre presentes
nos diferentes "projetos de vidas" e "praxias
profissionais", que através das corporeidades dos sujeitos os
manifestam no mundo das culturas modificadoras e construtoras do
mundo atual, e que também os modificam internalizando-as
intra-organicamente através da motricidade humana intencionalizada.
Referências
Bibliográficas
Damásio,
António R., O Mistério da Consciência, São Paulo: Companhia
das Letras, 2000.
Gazzaniga,
Michael S. e Heartherton, Todd
F., Ciência Psicológica, Porto Alegre: Artmed, 2005.
McArdle,
William D., Katch, Frank I. e Katch, Victor L. , Fisiologia do
Exercicio, 3ª edição, Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,1992.
Manuel
Sérgio, Para uma Epistemologia da Motricidade Humana, 2ª edição,
Lisboa: Compendium e Manuel Sérgio,1994.
Nasio,
J. D.< O Prazer de Ler Freud, Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editora, 1999.
Vargas,
Claudia D. Rodrigues, Erika Carvalho e Fontana, Ana Paula, in
Neurociência da Mente e do Comportamento, Coordenado por Roberto
Lente, Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008.
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(1) Fisioterapeuta -
IBMR; Mestre em Motricidade Humana - UCB/Capes; Professor Mestre
Adjunto I da UNIGRANRIO; Doutor em Filosofia da Religião -
SETESA/Não Capes; Formação em Psicanálise Clínica - SFPC;
Formação em Psicomotricidade Sistêmica - CEC; Formador-Didata em
Terapia Psicomotora Analítico-Clínica - TEPAC do CEBRASC;
Especialista em Educação - IBMR; Bacharel em Filosofia - SETESA;
Bacharel em Teologia - SETESA; Bispo Primaz do Catolicismo Apostólico
Salomonita (1902-2010).
(2)
Graduação em Psicologia (UGF - 1981), Psicóloga ( UGF-1982),
Psicomotricidade (UNESA- 1986), Formação em Psicomotricidade (
Instituto Alfred Binet, Paris -1990), Mestrado em Psicologia ( UGF
-1990) Doutorado em Psicologia e Qualidade de Vida ( AWU - 2004)
Diretora científica do CEC / RJ Professor universitário da SEFLU
. Professor da UCB . Membro titular da Sociedade Brasileira de
Psicomotricidade. Membro efetivo da Rede Internacional de
Pesquisadores em Motricidade Humana.
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