sábado, 28 de julho de 2012

Contextos Socioantropológicos - Módulo para Estudos


Prof. Felismar Manoel (1)

II Parte - 2 de 4

2.0 - – CULTURA E SOCIEDADE

Na unidade anterior percebemos que o ser humano tem presente em sí, elementos de natureza animal com os quais inicia o seu desenvolvimento e elementos próprios da socioculturalidade que ele cria, se ajusta e modifica permanentemente.
Nesta unidade vamos refletir sobre todos nós, como seres criadores de culturas, capazes de avaliar as realidades dos ambientes em que vivemos e de lhes atribuir valores, visando o bem estar pessoal e do grupo de convivência.

Vocabulário Técnico

Aéticos = Pessoas que se comportam com indiferença aos padrões ideais do grupo cultural.
Afinidades = Relação de pertinência boa que se estabelece entre pessoas, identificação.
Amorais = Pessoas que são indiferentes às normas ideais decondutas do grupo cultural.
Anáthema - (Ou anátema) = Condenação recebida da religião em razão do comportamento contrário ao padrão religioso aceito.
Antiéticos = Pessoas que se comportam de modo contrário aos padrões ideais do grupo cultural.
Caráter = Modo de ser verdadeiro de cada um de nós.
Cidadania = Refere-se ao atributo da pessoa alteritária em sociedade, dotada de direitos e deveres.
Cognoscitivo = Refere-se à capacidade de conhecer.
Cosmovisão = Modos de ver o mundo, de interpretar a realidade circundante.
Cultura = Tudo o que é produzido pelo ser humano.
Dinâmica da Alteridade = Refere-se a aceitação do outro como ele é, diferente de si, sem imposições, ou preconceitos e de se revelar ao outro, autenticamente, como si é.
Ethos = Palavra originária da língua grega, com a idéia de costumes locais.
Etnocentrismo Cultural Transitório = Posição de identificação com a cultura, na fase da juventude, ajudando na construção da identidade, formação do caráter e personalidades.
Etnocentrismo Social = Posição preconceituosa de sobrevalorização de uma cultura, julgando-a a melhor que as demais.
Ética da Convicção = Comportamento ostensivo baseado nas convicções pessoais.
Ética Humana = Diz-se do comportamento ostensivo baseado nas normas sociais de condutas aprovadas pela maioria cultural em uma sociedade.
Hethos = Palavra originária da língua grega, com a idéia da "dinâmica da localidade", para influenciar na formação da cultura da convivência do grupo.
Idiossincrasia = O que é próprio da singularidade de alguém, resultante de múltiplas influências, presente no seu jeito de ser.
Identidade Cultural = Relação de afinidades e identificação que ocorre entre o indivíduo e sua cultura.
Imorais = Fala-se de pessoas que adotam um comportamento ostensivo contrário ás normas de conduta adotadas pela maioria .
Interação Social = Aproximação colaborativa que ocorre entre as pessoas que vivem em comunidades sociais.
Leis Positivas = Fala-se das leis sancionadas, ou outorgadas por autoridades legítimas.
Moral Etnocêntrica = Norma de conduta aprovada pelo grupo cultural e livremente internalizada.
Moral Social = Norma de condutas aprovada pela maioria das culturas da sociedade.
Multiculturalidade = Existência de múltiplas culturas em uma sociedade convivendo em harmonia e colaboração.
Monocultural = Refere-se a sistema social onde predomina uma única cultura.
Personalidade = Modos de ser dos individuos diante das várias situações, ou circunstâncias, revelando traços do caráter pessoal.
Processos Sociais = Fases que ocorrem com as pessoas, na convivência comunitária, podendo ser tanto associativo, quanto dissociativo.
Relativismo Cultural = Conceito antropológico de que as culturas são sempre úteis para seus praticantes formarem identidades, caráter e personalidade, não havendo uma cultura melhor que outra, sendo as mesmas, apenas diferentes entre si.
Símbolos = Significantes de algo, através de um sinal arbitrário.
Subjetividade = O que é singular em cada um, fazendo de nós indivíduos únicos, sem outro igual.

2.1 - Hethos Local, Visão de Mundo, Valores e Bem Comum.

Convivência Local Compartilhada - Existe uma dinâmica na vida compartilhada, quando habitamos em uma mesma localidade, convivendo uns com os outros. Vivendo nessa localidade juntamente com outros, temos a tendência de interpretar a realidade à nossa volta, dando-lhe sentido de valor. Achamos que algumas coisas são boas para nós, como individuos, grupos ou comunidade, enquanto achamos que outras coisas não são boas. Aprovamos certas realidades existentes, enquanto condenamos outras. Este é o nosso juizo de valor, que no conjunto de conceituações vai criar a cultura local.
Os gregos antigos usavam a palavra hethos para designar a realidade da dinâmica desta vida compartilhada em uma localidade com uma mesma visão de mundo, agregada a valores, visando o bem geral do grupo, e usavam a palavra ethos para designar os costumes que se observava na vida dessa comunidade a partir desses valores cultivados ostensivamente.
Esse modo de interpretar as realidades do ambiente, os fatos e atos da vida do grupo, os fenômenos naturais, as interpretações da vida, do mundo; esse modo geral de interpretar as coisas, constitui a cosmovisão, ou visão de mundo dos que ali formam uma comunidade.

Esses conceitos construídos pelos que compartilham a vida local, são agregados às idéias de que são bons, ou são maus para a vida da maioria dos que ali vivem, constituindo seus valores culturais.
Esse conjunto de “verdades” construidas pelo grupo local, passa a constituir a sua cultura, aquilo que é aceito e cultivado pelo grupo como certo, o melhor , o que convém àquela comunidade, pois são esses valores que garantem o bem geral do grupo.

2.2 –Identidade Cultural, Moral Etnocêntrica, Ética da Convicção e Socialização da Convivência.

Esta cultura local passa a ser admirada pelas novas gerações que com ela se identificam. As crianças e jovens percebem que seus valores são bons e constroem suas referências a partir deles; criam com eles afinidades e identidade cultural.
Esses saberes e definições que surgem nessa localidade em consequência da sua cosmovisão, com seus valores , seus símbolos e significâncias, constitui o patrimônio cultural com o qual o grupo vai se identificar e viver , como modos de ser, em vida compartilhada socialmente.

Essa identificação é significativa para que os indivíduos construam suas subjetividades, tanto cultural como de gênero, que serão manifestas pelas idiossincrasias pessoais. Nesse sentido vai surgir aí um certo etnocentrismo cultural transitório, considerando esta cultura como significativa para cada um, ajudando seus membros na construção do caráter e estruturação da personalidade, principalmente na fase da adolescência.
Fala-se de etnocentrismo cultural transitório, porquanto é util para a construção da identidade cultural, principalmente na juventude, mas que não deve prevalecer como etnocentrismo social, por ser esse uma postura preconceituosa, que se julga melhor que outros sistemas culturais; deve-se ceder lugar ao relativismo cultural, quando da convivência com outros padrões culturais diferentes, pois o mesmo afirma que todas as culturas, mesmo sendo diferentes, são úteis para seus praticantes.
A cultura local construída e alimentada pelas pessoas visando o bem geral da comunidade, faz surgir alguns princípios, como normas de condutas preferidas para aqueles que ali vivem. Essas normas de condutas preferidas pelo grupo, quando são aceitas e internalizadas livremente por seus membros, passam a constituir a moral etnocêntrica dessas pessoas.
Em consequência dessa moral etnocêntrica livremente internalizada pelos membros do grupo, surgirão também os padrões de comportamentos livremente aceitos, classificados como ética da convicção desse grupo cultural que ali compartilha a experiência da vida em comunidade.
A socialização da convivência ocorrerá, através das instituições sociais adotadas, como a familia, a escola, a igreja, o estado, etc., cuidando de consolidar os ideais ali elaborados, em favor do bem estar geral da comunidade.
Quando convivemos em uma sociedade compostas por diversas comunidades, de modo multicultural, a convivência nossa com outras culturas, com suas diferenças de simbolos, significados e valores, não deve ser motivos para uma inibição de nossa cultura internalizada, a cultura que solidifica nossas convicções; também não deve nos levar ao desrespeito pela cultura dos outros, diferentes da nossa, pois a convivência harmoniosa com as diferenças e os diferentes enriquece a sociedade humana, tornando-a mais solidária e fraterna.

Na convivência com outras culturas deve-se dar lugar a ideia do relativismo cultural, que afirma ser as culturas , nem melhores nem piores umas em relação às outras, sendo as mesmas apenas diferentes entre si.

2.3 – Comunidade, Dinâmica da Alteridade e Cidadania.

Em uma comunidade social poderá haver diversos grupos sociais de convivência, mas há um certo vínculo afetivo unindo as pessoas, além de certos limites territoriais; há aí uma tendência da continuidade do modo de vida de uma geração com outra; as pessoas tendem a ter um estilo de vida que vai do berço ao túmulo; a proximidade física permite vínculos mais significativos.

É nesse ambiente que surgirá a dinâmica da alteridade orientando as relações interpessoais, ajudando a conhecer-se melhor através do outro , diferentes nas subjetividades, mas um ser igual ao outro em direitos e deveres (cidadania).
A alteridade é uma relação dialogal que se estabelece entre duas pessoas, - entre um eu e um tu. Trata-se de uma relação igualitária, ordeira e equilibrada; nenhuma das partes se sobrepõe à outra de nenhuma forma ; a relação entre as duas pessoas se estabelece em prol de uma terceira relação, que poderá ser uma causa comum, um ideal, ou algo a ser construido em conjunto.
O cultivo da alteridade produz a verdadeira cidadania, onde se protege e cumpre direitos e deveres, gerando a solidariedade, a paz e a convivência mais humana e fraterna.

2.4 – Sociedade, Moral Social, Ética Humana e Lei Positiva.

A sociedade se caracteriza pela convivência em um espaço onde há um conjunto de leis e regulamentos racionalmente elaborados. As relações sociais tendem a ser formalizadas e impessoais. Ai os individuos não dependem uns dos outros para seu sustento e estão menos comprometidos moralmente entre si.
A sociedade é composta de agrupamentos humanos, diversas comunidades sociais, onde predominam contatos sociais secundários e interpessoais, com uma complexa divisão do trabalho e forte presença do Estado, que é sustentado por forte aparelho burocrático.

Nas sociedades tem lugar a multiculturalidade, pois diferentes comunidades culturais as compõem. É aí que vai conviver cidadãos de diversos matizes culturais com seus diferentes costumes, seus valores, suas morais etnocêntricas e suas respectivas éticas das convicções.
Nesse conjunto variado de normas de condutas e padrões de comportamento de cada comunidade cultural, em constantes contatos de comunicação , aproximação e convivência das diferenças, além de melhor conhecer uns aos outros, reforça-se normas de condutas que são comuns, ou que se adequam aos diferentes grupos culturais, passando a ser aceitos e constituídos como moral social.
De modo semelhante ocorre com os diferentes padrões de comportamentos ostensivos, das éticas das convicções dos variados grupos culturais, facilitando a identificação daqueles pontos que são similares nas diferentes éticas, compondo pontos em comum, ou que se adequam à maioria dos grupos culturais, passando a constituir a ética humana.
O Estado ao elaborar as Leis Positivas nas sociedade multiculturais para o controle da ordem, o faz em sintonia com a moral e a ética comum da sua população, considerando-se a moral social e a ética humana comumente reconhecidas.
Em uma sociedade, ou mesmo nas comunidades sociais , ou grupos culturais, surgem membros do grupo que se tornam indiferentes às normas de condutas e aos padrões de comportamento, constituindo-se nos amorais e aéticos.
Por outro lado, ocorrem aqueles que se colocam contra as normas morais e contra os padrões éticos aceitos, sendo considerados imorais e antiéticos.
Esses imorais e antiéticos trazem grave prejuizo a normalidade da vida comunitária e social, levando o Estado a elaborar as Leis Positivas, no sentido de impor a ordem e normalizar a vida coletiva.
O cumpridor da lei é o cidadão de bem, regularmente aceito e recomendado na vida social. O descumpridor da lei é considerado marginal, meliante , ou criminoso, sendo punido pelo Estado que detém o poder de polícia.
Também as Igrejas (as religiões), que se organizam como instituições de direito privado, elaboram suas leis positivas para ordenar a vida dos seus membros no seio da comunidade, sendo os cumpridores dessa lei considerados crentes ou fieis, bem aceitos, enquanto os descumpridores são considerados anáthema e geralmente mal vistos pela comunidade.

É nos grupos culturais, nas comunidade sociais e nas sociedades que ocorrem a interação social , podendo ser de pessoa a pessoa, de pessoa a grupo, e de grupo a grupo, supondo assim, a existência de reciprocidade nas ações entre individuos.
Também ocorrem os processos sociais podendo ser processos associativos, como cooperação, acomodação e assimilação, que estabelecem formas de ações por esforço comum, convivência harmoniosa e consenso no grupo em prol do bem comum; ou processos dissociativos, como competição e conflito, quando relacionados a formas de divergência, oposição e querelas, que podem se manifestar de modos diferentes, desarmonizando a convivência.
Os profissionais de saúde, quando desenvolvendo missões de saúde em outros paises, ou outras culturas, devem estar atentos; pois existem repúblicas monoculturais, onde não se permitem outras manifestações culturais; suas respectivas morais etnocêntricas e éticas das convicções, são , nesses casos, impostas como moral social e ética humana.
Um bom indicativo para o profissional de saúde, nessas situações acima referidas, é, em primeiro lugar, observar os costumes praticados pela população e respeitá-los; em segundo lugar , procurar conhecer os principios que norteiam tais normas de condutas e padrões de comportamentos; pois assim, estará conhecendo a moral social e a ética humana, adotada por aquela monocultura; e por último, conhecer a lei positiva que vigora naquela localidade.

É sempre bom e até imperativo, que os profissionais de saúde sejam cumpridores da lei do pais ou nação onde estiverem exercendo suas profissões.

Ainda é conveniente uma reflexão sobre as estratificações sociais.
A estratificação social é o agrupamento dos membros de uma sociedade em camadas ou estratos superpostos e hierarquizados segundo algum critério de importância sociológica. Existem sociedades nas quais os seus estratos se fazem por castas, como acontecia no inicio do Brasil Colônia, onde havia o povo, o clero e a nobreza e ainda se vislumbra alguma presença deste sistema em alguns paises, como na India.
Em nossa sociedade atual capitalista, consumista, prevalece o sistema de classes sociais baseada no poder econômico, como se houvesse "mais valia" em quem tem o maior poder aquisitivo. Esse tipo de sociedade geralmente se perde no "ter", ignorando o "ser", embora os valores confessados em nossa civilização ocidental, de origem judaico-cristã, sejam pelo ser, afirmando-se na cidadania jurídica, filosófica e cristã.


Em nossa sociedade fala-se em classe baixa, classe média e classe alta, podendo ser pensada em forma de uma pirâmide social, onde a base muito mais ampla é formada pela classe baixa dos assalariados, um pouco acima, no centro da pirâmide, em número menor situa a classe média e acima, no topo da pirâmide fica a classe alta, de maior poder econômico, composta com um menor número de pessoas. Este tipo de sociedade sustenta um sistema desequilibrado de distribuição das riquezas do país.
Embora, teoricamente exista a mobilidade social, permitindo que seus elementos migrem de uma situação para outra, sabe-se que é muito difícil os elementos da classe baixa, mais ampla, migrarem para a classe média e classe alta, sendo talvez os estudos superiores e técnicos especializados, o meio mais eficiente para permitir a ascensão social no Brasil atual.

Questionário – Para fixar o conhecimento, consulte o texto acima e responda as questões que seguem:

1 - Diferencie os conceitos de hethos e ethos.
2 - O que quer dizer identidade cultural?
3 - Qual a diferença entre etnocentrismo cultural transitório e etnocentrismo social?
4 - O que é relativismo cultura?
5 - Qual a diferença entre comunidade social e sociedade?
6 - O que é a dinâmica da alteridade?
7 - Diferencie moral etnocêntrica de moral social e ética da convicção de ética humana.
8 - O que é estratificação social?

Bibliografia Recomendada:

DIAS, Reinaldo. Introdução à Sociologia. Reinaldo Dias, São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005.
HELMAN, Cecil G. Cultura, Saude e Doença, 4ª edição. Porto Alegre: ArtMed, 2003.
LARAIA, Roque de Barros. Cultura – Um Conceito Antropológico, 22ª edição. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
OLIVEIRA, Pérsio Santos de. Introdução à Sociologia. São Paulo: Editora Ática, 2004.

===> Continua em III Parte - 3 de 4
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(1) Fisioterapeuta - IBMR; Mestre em Motricidade Humana - UCB/Capes; Professor Mestre Adjunto I da UNIGRANRIO; Doutor em Filosofia da Religião - SETESA/Não Capes; Formação em Psicanálise Clínica - SFPC; Formação em Psicomotricidade Sistêmica - CEC; Formador-Didata em Terapia Psicomotora Analítico-Clínica - TEPAC do CEBRASC; Especialista em Educação - IBMR; Bacharel em Filosofia - SETESA; Bacharel em Teologia - SETESA; Bispo Primaz do Catolicismo Apostólico Salomonita - CAS/ICAI-TS(1902-2010).


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