Prof.
Dr. Felismar Manoel (1)
Introdução
Infelizmente,
no Brasil urbano mais que no Brasil rural, a meditação é vista sob
um olhar preconceituoso, ou como coisa de pessoas extravagantes,
párias, "matusquelas", tipos "estranhos no ninho";
e isto é uma pena, pois a meditação exerce ação fisiológica
altamente significativa à saúde das pessoas.
Tenho
convivência com a meditação indígena desde minha infância, junto
aos nativos puris de terceira e quarta geração, já acostumados com
a cultura dos colonizadores, mas que tiveram o cuidado de não
abandonarem aquilo que lhes constituía um patrimônio próprio, nas
regiões da zona da mata mineira, mais precisamente nas cercanias de
Cruzeiro, no Município de Guiricema.
No
ambiente do Catolicismo de Roma aprendi a meditação em temas
religiosos e percebi que também esta modalidade produz os mesmos
efeitos fisiológicos; quando me transferí para o Catolicismo
Salomonita aprendi a meditação como método de obtenção da
sinesis,
para
aprofundamento em questões de espiritualidade, tanto a nível
individual, quanto grupal.
Foi
nas comunidades esotéricas, tanto ocidentais quanto orientais, que
aprendi de modo mais estruturado a meditação, e nestes ambientes,
como forma de promoção e tratamento da saúde, visando a vida
em plenitude; não a plenitude da eubiótica
(dinâmica da vida perfeita idealizada), mas a plenitude da
calibiótica
(dinâmica da vida de boa qualidade que está ao nosso alcance). O
treinamento do Qi
Gong Taoista,
na esfera da medicina chinesa, trouxe muito enriquecimento na minha
prática da meditação.
Neste
ensaio, não pretendo um recorte acadêmico rigoroso, que agrade aos
paladinos do cartesianismo, pretendo apenas expor, para os leitores
de boa vontade a simplicidade da prática da meditação diária,
mostrando em linguagem simples os benefícios que ela nos traz.
A
Meditação na Cultura Indígena
Sou
herdeiro da cultura indígena puri de terceira geração, que
convivia, compartilhava e servia aos fazendeiros italianos, e
portanto, mesclada de valores dos colonizadores e circunstâncias do
meio ambiente. Meus bisavós eram, Indira Puri, das margens do rio
pombo, casada com Tongo Mina, africano que vivia naquela região
mineira; deles surgiu em primeira geração a minha avó Maria
Graciana, que casou com Juaquim Soares de Souza Lima, um português
de Coimbra; desse casamento surgiu, na segunda geração, a minha mãe
Maria Soares que casou com Felício Manoel Julinho, descendente de
família italiana; dessa união matrimonial surgiu a terceira
geração, na qual eu me incluo entre mais quatorze irmãos.
Nasci
e cresci no meio rural em contato com os povos nativos da região,
sendo todos vulgarmente chamados de puri, em consequência de ser a
região de ocupação dos índios com esse nome. Desde criança, ao
contrario de meus irmãos, tive interesse pela tradição cultural
dos povos, o que me fez aproximar da vida clerical com a Igreja de
Roma, único meio de expressão cultural formativo na região.
Infelizmente discordei das orientações de Roma e me transferi para
o Catolicismo Salomonita, onde consolidei minha formação, mais
compatível com os ensinamentos dos evangelhos de Jesus de Nazaré,
para mim a bússola segura para um mundo melhor e uma espiritualidade
perfeita.
Foi
no ambiente da cultura puri que aprendi a meditar desde criança. A
meditação indígena utiliza-se como primeiro método para a
meditação, o emprego dos sons de tambores e de flautas de taquaras,
acompanhados da emissão de palavras sagradas; o seu objetivo é a
expansão da consciência para a percepção de circunstâncias
especiais que necessitam de orientações também especiais. Este
estado de consciência expandida permite uma expressiva sensação de
paz, de alargamento da compreensão e de bem estar geral.
Os
povos puris utilizam também de outras técnicas para a prática da
meditação, como a do fogo sagrado, as das fontes das águas, do
inebriar dos vegetais e da própria revolução do tempo nas
tempestades; entretanto, estes são detalhes que não nos interessa
expor aqui.
Diferentes
universidades e grupos culturais se voltam para o estudo e a prática
desta herança indígena da meditação. Na USP existe um movimento
na Escola de Saúde Pública, através de um antropólogo
psicanalista, que está associando a prática da meditação com a
promoção da saúde e a prevenção de enfermidades; existe também
em São Paulo o Grupo da Plena Atenção usando as técnicas de
meditação inspirada na cultura indígena; também em Amazonas
movimento semelhante tem acontecido; na Austrália, uma faculdade
criou o Centro Cultural Indígena e de Meditação, no qual está
aliando a meditação a uma formação de cultura ecológica.
A
meditação usada na cultura indígena é parte de seu patrimônio de
recursos técnicos culturais para resolver problemas de ordem prática
na comunidade, tratamento de desequilíbrios e promoção do bem
estar da população.
A
Meditação nos Ambientes Esotéricos
Existe
algum preconceito social e religioso por parte das massas urbanas,
com relação ao conceito de esotérico; e é uma pena, pois se trata
de um afastamento por questões de ignorância do que seja o
esoterismo.
Quando
se fala em esoterismo, está se referindo a um sistema de semiótica
na área da comunicação. Um bom exemplo desse sistema, é o
conjunto de sinais que se usa no trânsito para orientar os
condutores de veículos; estes devem saber que atitude tomar
naqueles espaços onde está o indicativo do sinal de trânsito.
Trata-se de um sistema esotérico, pois só os que conhecem aquela
mensagem da placa de trânsito, sabem interpretar qual a conduta que
se cobra do condutor de veículos para aquela área demarcada. No
sistema esotérico utiliza-se também o exotérico, entendendo-se com
esta palavra, tudo aquilo que é dito e que está no nível de
compreensão de todos presentes, a nível de massa cultural.
Os
mosteiros, escolas, centros e também os templos esotéricos,
utilizam um processo semelhante ao dos condutores de veículos
automotores, para transmitir os ensinamentos esotéricos, aqueles
conteúdos que exigem um nível de cognição mais abstrata e
simbólica.
Estes
espaços se dedicam a preparar pessoas de boa vontade, que querem se
dedicar a construir um mundo mais compreensivo e capaz de ajudar a
manifestação e fluxo da vida, em paz, em fraternidade, em
cidadania, em solidariedade. Estes espaços são formados cultural e
tecnicamente, nas áreas da saúde, da educação, da
espiritualidade, da convivência, da filosofia, da religião, e é um
sistema que está aberto a qualquer grupo humano. Trata-se de um
sistema que vai treinar pessoas e capacitá-las para levar os seus
préstimos e ação colaborativa sempre que elas se fizerem
necessários, sem se importar se o ser assistido compreende
intrinsecamente o que ele está fazendo. Por isso vale-se de sinais,
figuras, símbolos, monumentos, anagramas, ou quaisquer outros
recursos de semiótica, que ao ser visto por quem foi treinado, vai
saber como se comportar, ou o que fazer naquelas circunstâncias
surgidas, para gerar um bem geral, ou maior.
Na
grande maioria das vezes, o treinamento para se obter uma atitude de
paz, de tranquilidade, de vida plena, começa com o ato da
imaginação, fortalecido pela reta intenção e desejo de fazer o
bem, que irá gerar o estado de bem que se procura. O sistema
esotérico é interessante, porque cada pessoa que o aprende e
apreende, vai usá-lo de acordo com o seu arsenal potencial, podendo,
portanto se adequar a qualquer pessoa capacitada, bastando
inicialmente ter boa vontade e uma vida virtuosa, podendo ser
aplicado em qualquer circunstância.
Infelizmente,
nos dias de hoje, a meditação está virando mais uma mercadoria em
nossa sociedade neoliberal consumista. Existem pessoas que
transformam as instruções em "pacotes de informações"
para venda, sem se importar com o acompanhamento e assistência, para
que o seu exercício seja ético, dirigido por um aceitável padrão
de vida comportamental, cidadania e moralidade. A comercialização
faz correr o risco da perda de garantia destas qualidades. Fiquem
vigilantes.
Fundamentos
Científicos da Meditação
Os
avanços das neurociências na época atual, tem permitido alargar o
nosso conhecimento sobre o cérebro e as atividades cerebrais.
Sabemos que as atividades do cérebro emitem ondas que podem ser
medidas, e geralmente essas medições orientam intervenções
profissionais, tanto na saúde quanto na educação.
Normalmente
se considera quatro tipos de ondas, pela ordem das atividades, se
classificando como segue:
*
A onda beta: com frequência de 14 a 30 ciclos por segundo, é aquela
das nossas atividades de pensamento conceitual, do nosso dia a dia;
*
A onda alfa : com frequência de 08 a 13 ciclos por segundo, é
aquela do relaxamento profundo, em alerta, com mente e pensamento
esvaziado ao máximo possível;
*
A onda theta : com frequência de 04 a 07 ciclos por segundo, é
aquela do sono com sonhos (com movimento dos olhos);
*
A onda delta : com frequência de 0,5 a 03 ciclos por segundo, é
aquela do sono profundo sem sonhos (sem movimento dos olhos).
A
prática da meditação no interesse da saúde , bem estar e
qualidade de vida, se situa no nível da onda alfa, sendo em torno
dela que vou fazer algumas reflexões.
Hemisférios
Cerebrais Especializados
Inicialmente
vamos desfazer uma confusão frequente nos ambientes de saúde e
educação, no que consiste às ideias de "dominância
hemisférica" e "lateralidade funcional corporal".
O
neocórtex, quer dizer o cérebro dos primatas humanos é dividido em
duas metades bastante parecidas denominadas de "hemisférios",
e de um modo bem generalizado, se considera que o hemisfério
dominante é aquele que controla a linguagem humana. Sabe-se que a
maioria das pessoas tem o controle da linguagem fonética no
hemisfério esquerdo.
A
situação não é tão simples, pois sabe-se que a fala humana é
acompanhada das inflexões, que comportam aspectos emocionais,
afetivos, racionais, entre outros. Na prática, observa-se pessoas
com certas características comportamentais que as distinguem de
outras, como tendência para as ciências logico-matemáticas,
enquanto outras se distinguem por uma tendência mais aberta às
coisas do universo como um todo, por uma característica mais
panorâmica da vida. Quando se observa estas distinções, está se
cogitando de hemisfério dominante; aqui neste ensaio não interessa
ter domínio desse assunto, precisa-se saber apenas que qualquer um
de nós tem um hemisfério cerebral dominante.
Com
relação a lateralidade funcional corporal, que muito se confunde
com hemisfericidade dominante, refere-se ao predomínio de
iniciativas e controle de execução de atividades corporais, que se
iniciam pelo lado direito, ou pelo lado esquerdo, em qualquer um de
nós. Estes estudos são aprofundados em psiconeuromiocinética, ou
psicomotricidade.
Para
nosso raciocínio sobre a meditação, precisamos saber que, qualquer
um de nós sempre teremos nossas ações iniciadas predominantemente
sob o comando de um hemisfério cerebral, mas que sempre funcionará
envolvendo todos as áreas cerebrais, e portanto, também o outro
hemisfério contra lateral estará em atividade.
A
Sincronização da Frequência Alfa (a)
Quando
uma pessoa começa o exercício da meditação, ela estará começando
sua atividade cerebral a partir do seu hemisfério dominante; ela
estará em uma disciplina de controle respiratório, postura,
atenção, intenção, imaginação e tudo isto aliado a consciência
corporal e do ser. A busca pacífica desse estado, leva o seu
hemisfério dominante a entrar na frequência alfa; ao insistir na
continuidade do treinamento, o outro hemisfério cerebral também
passa para a frequência alfa de modo sincronizado.
Efeitos
Fisiológicos Observados
Quando
se consegue a sincronização alfa observa-se o relaxamento corporal
profundo, em consequência das mudanças bioquímicas produzidas
corporalmente na pessoa:
Diminuição
da adrenalina circulante; diminuição do cortisol; redução da
ansiedade e do estresse; sensação de bem estar e paz; melhora da
cognição; entre outros.
Quando
a meditação torna-se uma disciplina diária, em ambiente adequado,
tempo adequado, controle adequado, poderá baixar os níveis de
frequências em direção a delta (d),
favorecendo o desenvolvimento da criatividade.
As
meditações temáticas, objetivando a obtenção da sínesis
(sintonia
com conhecimentos), requer direcionamento e assistência de alguém
treinado e responsável. Elas são praticadas nos mosteiros e centros
de pesquisas em saúde e educação em várias partes do mundo.
A
Meditação na Saúde e Educação
A
meditação poderá ser praticada em busca do equilíbrio da
atenção, da cognição, da conação (esforço consciente, formação
da vontade e da atenção) e da afetividade.
Com
sua prática geralmente se obtém melhoras na concentração e no
relaxamento, no controle dos sentimentos, na quietude mental, na
criatividade, na paciência e no equilíbrio pessoal.
Na
saúde a meditação produz sensação de bem estar, regulação do
sistema imunológico, regulação hormonal para o controle do estado
de alerta, do estresse e da ansiedade.
A
meditação tem sido indicada para o controle da depressão, da
hipertensão arterial, da hiperatividade, dos transtornos
alimentares, dos transtornos do sono e da bipolaridade.
Referências
Bibliográficas
Manoel,
Felismar. Apostilas de Meditação Vitalizante. Rio de Janeiro:
Centro Brasileiro de Calibiótica, 2011
Manoel
Felismar. Treinamento da Energia Vital. Rio de Janeiro: Centro
Brasileiro de Calibiótica, 2008
Manoel,
Felismar. Apontamentos de Psiconeuroimunologia para Sala de Aula.
Rio de Janeiro: Centro Brasileiro de Calibiótica, 2006
Yu,
Lu K'uan (Luk, Charles). Yoga Taoista - Alquimia e Inmortalidad.
Madrid: Altalena, 1982
Zohar,
Danah. O Ser Quântico. Rio de Janeiro: Best Seller, 2012
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- Professor Mestre Adjunto I da UNIGRANRIO; Doutor em Filosofia da
Religião - SETESA/Não Capes; Mestre em Ciências da Motricidade
Humana - UCB/Capes; Formação em Psicanálise Clínica - SFPC;
Formação em Psicomotricidade Sistêmica - CEC; Formador-Didata em
Terapia Psicomotora Analítico Clínica - TEPAC do CEBRASC;
Especialista em Docência Superior - IBMR; Bacharel em Fisioterapia -
IBMR; Bacharel em Filosofia - SETESA; Bacharel em Teologia - SETESA;
Bispo Primaz do Catolicismo Evangélico Salomonita - ICAI-TS.
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